terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

FILMES SOBRE O PROBLEMA DO DETERMINISMO E DA LIBERDADE 2 - RELATÓRIO MINORITÁRIO


FILME 2
RELATÓRIO MINORITÁRIO
SINOPSE
Washington, 2054. O assassinato foi banido, pois há a divisão pré-crime, um sector da polícia onde o futuro é visualizado através de paranormais, os precogs, e o culpado é punido antes de o crime ter sido cometido. Quando os três precogs, que só trabalham juntos e flutuam conectados num tanque de fluido nutriente, têm uma visão, o nome da vítima aparece escrito numa pequena esfera e noutra esfera está o nome do culpado. Também surgem imagens do crime e a hora exacta em que acontecerá. Estas informações são fornecidas para uma elite de agentes policiais, que tentam descobrir onde será o assassinato. Mas há um dilema: se alguém é preso antes de cometer o crime, pode esta pessoa ser acusada de assassinato, pois o que motivou a sua prisão ainda não aconteceu? O líder da equipa de polícias é John Anderton (Tom Cruise), que perdeu o filho há seis anos em virtude de um criminoso o ter raptado. O desaparecimento da criança tornou-o viciado em drogas. Apesar disso, é o polícia mais competente da divisão pré-crime. Porém, algo muda totalmente a sua vida quando vê, através dos precogs, que matará um desconhecido em menos de trinta e seis horas. A confiança que Anderton tinha no sistema rapidamente se perde. Segue uma pequena pista, que pode ser a chave da sua inocência: um estranho caso que não foi solucionado e do qual há um “relatório menor”, uma documentação de um dos raros eventos no qual o que um precog viu é diferente do que os outros viram. Mas apurar isto não é uma tarefa fácil, pois a divisão pré-crime já descobriu que John Anderton cometerá um assassinato e todos os que trabalhavam com ele tentam agora capturá-lo.
(Adaptado, Wikipedia)

DESCRIÇÃO E COMENTÁRIO
Minority Report, filme produzido por Steven Spielberg em 2002, é uma ficção que retrata como seria o mundo do futuro, futuro esse em que os avanços da modernidade possibilitaram a construção de um sistema criado para coibir a violência e proteger os indivíduos deles mesmos, ou melhor, das suas inclinações maldosas. O detective John Anderton (interpretado por Tom Cruise) é chefe do Departamento de Pré-Crimes, que está há seis anos em actividade. Tudo se  passa em Washington, Distrito de Columbia, capital dos EUA, no ano de 2054. Regressando ao ano de 2048, o índice de homicídios alcançou proporções alarmantes. A partir daí instituiu - se o Programa Pré-Crime, que em um mês de funcionamento reduziu em 90% o índice de assassinatos no Distrito de Columbia. Com seis anos de existência do programa, deixou de haver crimes. Os meios de comunicação desenvolvem forte campanha para que os cidadãos, em plebiscito, a ser realizado em 22 de Abril de 2054, digam “sim” à adopção do Programa Pré-Crime a nível nacional.
Lamar Burges, criador e director do programa, defende a implementação deste a nível nacional, e, para tanto, é preciso provar à sociedade e ao governo do país que o sistema é eficaz e, principalmente, infalível, sob a promessa de “assegurar que o que nos mantém seguros também nos mantém livres”. O Departamento de Pré-Crimes consiste num órgão de defesa privado que apoia a população da capital na prevenção de crimes que irão, até certo ponto, inevitavelmente acontecer. Isso graças a três jovens com sentidos paranormais, chamados pré-cognitivos, que possuem o desconcertante dom de prever o futuro, antever assassinatos e outros crimes hediondos, minutos ou horas antes de eles acontecerem. Os pré-cogs são seres humanos especiais, que resultaram de experiências científicas. São eles que antevêem os crimes, orientando a acção do Departamento Pré-Crime. O sistema, através de seus principais actores, tem a pretensão de infalibilidade.
As imagens das suas visões são enviadas para um computador que as transfere para arquivos visuais, onde cabe aos polícias disso encarregues, descobrir onde se encontra o criminoso e prendê-lo antes que seja tarde demais. O que acontece é que a pessoa, quando surpreendida pela equipa de segurança, estaria prestes a cometer o crime, porém sem tê-lo cometido. Não há forma de julgamento tal como a conhecemos mas a pessoa pré-criminosa é confinada numa prisão como se tivesse cometido efectivamente o crime que, em princípio, inevitavelmente cometeria. Isto desafia as até então conhecidas leis da relação espaço – tempo. Essa controvérsia traz um agente federal especialmente enviado pelo governo para averiguar se não há falhas nesse sistema. Ao conhecer o departamento, ele confessa que “a ciência roubou a maioria dos milagres... mas dá - nos a esperança no divino”, referindo-se à deificação dos chamados pré-cogs. Os integrantes do órgão concordam: “Trabalhamos para alterar o destino das pessoas; parecemos sacerdotes e não polícias”.
A sequência de abertura do filme, na qual um homem é preso pelo homicídio iminente da sua esposa e do seu amante, mostra o programa em acção e apresenta o protagonista do filme, o chefe de polícia John Anderton, interpretado por Tom Cruise.
Os Precogs são mantidos em flutuação numa piscina com nutrientes, à margem dos restantes membros do Departamento. Quando funcionários do Departamento de Justiça chegam para investigar o programa, entram na área da piscina e John Anderton segue - os. É agarrado pela Precog feminina – Agatha – que revela uma visão anterior de um homicídio prestes a acontecer. Anderton observa os registos desse homicídio e descobre que o pretenso homicida não foi identificado. Interroga – se por que não houve identificação e sobre o que aconteceu com a vítima, uma mulher chamada Anne Lively. A investigação desse incidente condu - lo a um problema: ele próprio é identificado como o autor de um futuro homicídio. Trata-se do futuro homicídio de uma pessoa que descobre ser o sequestrador do seu filho.
A história consiste a partir daí na tentativa, por parte de Anderton, de entender o significado do homicídio de Anne Lively. Procura descobrir quem estabeleceu as circunstâncias nas quais ele matará o sequestrador do seu filho e impedir a sua própria prisão por um homicídio que está certo que não cometeria. Descobre que Anne Lively é a mãe da Precog Agatha e que esse homicídio realmente ocorreu. Ao examinar os registos da previsão, Anderton nota que as marolas do lago na imagem que examina estão a correr em direcção oposta na segunda imagem. Não é incomum que as visões dos Precogs “ecoem”, se repitam na mente dos Precogs, mas ele percebe que essa é uma visão diferente. A primeira visão é uma ficção, a representação de um imaginário homicídio futuro, mas a segunda imagem é a do homicídio como ele realmente ocorreu. John Anderton acaba por deduzir que o homicida é o director do programa Pré-crime, Lamar Burgess. Anne Lively queria que a sua filha voltasse ao seu convívio, mas como Agatha é a mais talentosa das Precogs, Burgess temia que o programa não sobrevivesse à sua saída. É para impedir a descoberta da identidade de Lively e da sua própria culpa que Burgess cria uma armadilha a Anderton.
Conforme vai investigando o homicídio de Anne Lively e tenta evitar a prisão como um “futuro infractor”, John Anderton, que até então nunca teve dúvidas sobre o programa, descobre que nem sempre há consenso entre os Precogs. Visita a mulher que originalmente desenvolveu a ideia de usar as visões das pessoas com dons de precognição e é informado sobre a possibilidade de diferenças nas visões dos três Precogs. Algumas vezes, um dos Precogs vê um resultado diferente, no qual o assassinato não ocorre: o infractor pode ter decidido matar a vítima, mas por uma razão ou outra não consuma o acto. Essa visão diferenciada corresponde ao “relatório minoritário” ou registo dissonante (Minority Report) do título do filme. Anderton não tinha qualquer conhecimento dessas visões alternativas. É informado de que tais visões alternativas não são transpostas para os computadores e registadas, como ocorre com os relatórios maioritários. São ocultadas na memória do Precog que as gerou.
A existência de relatórios minoritários em alguns casos significa, evidentemente, que os resultados dos cenários dos homicídios não são fixos. Anderton quer saber se há um relatório minoritário no seu caso, mas é informado de que não há.
Quando localiza o homem que acredita ter sequestrado o seu filho, Anderton encontra a fotografia do menino na cama do quarto daquele, entre uma pilha de outras fotografias de crianças jovens, o que sugere tráfico de crianças ou uma rede de pedofilia. O homem revela que ele é de facto um criminoso, mas que recebeu a promessa de liberdade e de assistência à sua família se fizesse parecer que ou assassinou o menino ou o sequestrou. Anderton não o mata, mas tenta prendê-lo. As coisas correm mal. O sequestrador tem uma queda fatal da janela do quarto. Ocorre a morte que havia sido prevista, mas Anderton não cometeu um homicídio doloso. Anderton percebe que a localização da fotografia do seu filho na cama do sequestrador, entre fotos de tantas outras crianças presumivelmente sequestradas, cria uma situação em que ele está mais propenso a perder o controlo e matar a sua futura vítima. Para ele esta é a mais grave provocação. Mas mesmo com essa arrasadora descoberta, Anderton – como a Precog Agatha reiteradamente lhe lembra – ainda tem uma escolha. Ele escolhe prender mas não matar o suposto  sequestrador do seu filho.
Em Minority Report, todavia, vemos que não são apenas os culpados ou aqueles com algo a esconder que são detectados e vigiados pelas actividades operacionais do programa Pré-crime. Vemos na sequência das aranhas que todos os residentes do bloco de apartamentos são alvos, e que são os mais inocentes – as crianças – os que se assustam mais. Ainda mais preocupante: sabemos que Jack Anderton não previu o homicídio no qual é identificado como autor, e que a precognição foi induzida por uma armadilha preparada pela própria pessoa que é verdadeiramente culpada do assassinato de Anne Lively.Com que objectivo? Impedir alguém, que é inocente, de descobrir o que realmente aconteceu com Anne Lively.
Em vez de ser lançado a nível nacional, o programa Pré-Crime é cancelado e abandonado. Os seus presos são soltos. A única forma de manter os pré-cogs longe de tanta dor dada a sua capacidade de antever crimes hediondos foi isolá-los numa ilha distante de todo o resto da civilização.

ACTIVIDADES SOBRE O FILME
1.Faça um resumo do filme.
2.Esclareça o que se entende por determinismo.
R: O determinismo é a crença de que tudo tem uma causa.
3. Caracterize o que habitualmente se entende por livre – arbítrio.
R: O livre – arbítrio é a possibilidade de fazermos o que queremos (embora não seja sinónimo de fazer tudo o que queremos).
Para haver livre – arbítrio duas condições devem verificar – se:
1 – Devemos ter duas ou mais possibilidades de acção em aberto quando se trata de escolher o que vamos fazer.
2 – As nossas escolhas não devem ser forçadas.
Agir livremente é fazer algo podendo contudo ter feito outra coisa.
O conceito de livre – arbítrio desempenha um papel central na vida moral porque é baseado nele que consideramos as pessoas moralmente responsáveis pelas coisas que fazemos. Acredita – se que sem livre – arbítrio não faz sentido elogiar e censurar certas acções.
4.Caracterize o determinismo radical.
R: O determinismo radical afirma que todas as nossas acções são determinadas por causas anteriores e por isso não são livres (não podemos realmente escolher não as fazer ou realizar).
5. Distinga determinismo radical de determinismo moderado.
O determinismo moderado, também denominado compatibilismo ou determinismo reconciliador, é a tese segundo a qual o facto de o determinismo causal ser verdadeiro não impede que ajamos livremente desde que por acção livre se entenda uma acção sem constrangimentos externos, ou seja, causada pelos nossos desejos, crenças e sentimentos.
Para o determinismo moderado os actos livremente realizados são aqueles cujas causas imediatas são estados psicológicos ou internos do agente. Actos não realizados livremente são aqueles cujas causas imediatas são estados de coisas externas ao agente. Deve notar – se que o determinismo moderado é uma posição determinista que salva o livre – arbítrio modificando a sua caracterização. Agir livremente não é agir de uma maneira podendo contudo ter agido de outra forma. Agir livremente é agir sem ser constrangido por causas externas.
Assim, o compatibilismo defende:
1 – Todo o comportamento humano é determinado por causas ou condições anteriores, pelo que dadas essas condições, nenhuma outra acção é possível a não ser a que realizamos.
2 – As nossas acções são livres no sentido em que não são externamente constrangidas ou forçadas.
3 – As causas das acções livres são certos estados internos do sujeito tais como desejos, crenças e sentimentos.
Para o determinismo radical, as acções humanas são efeitos cujas causas são outros acontecimentos anteriores. Essas causas são factores de tipo ambiental (a educação e o modo como fomos criados), genético e psicológico (experiências anteriores). Ora se a causa das nossas acções reside em factores que o sujeito não controla, não podemos dizer que ele age livremente ou que tem a possibilidade de escolher o que faz.
Para o determinismo radical, afirmar que tudo tem uma causa implica negar o livre – arbítrio, ou seja, implica afirmar que, dadas as causas que influenciam o nosso comportamento, agimos de uma maneira e não podemos agir de modo diferente.
Para o determinismo moderado, afirmar que tudo tem uma causa não implica negar o livre – arbítrio, ou seja, as nossas acções são causadas por estados internos e não por factores externos.
Para o determinismo radical, não é possível conciliar livre – arbítrio e determinismo. Já o determinismo moderado julga possível afirmar que todas as acções são causadas e, contudo, livres.
6. A existência no departamento de polícia de Pré – Cogs a quem se atribui capacidade de previsão infalível parece representar a negação da liberdade e da responsabilidade moral. Porquê?
R: Os pré – cogs são seres humanos que mediante engenharia genética têm a capacidade que os torna quase semelhantes a Deus: predizer com absoluta certeza o que iremos escolher e fazer. Se os pré – cogs são dotados de pré – conhecimento supostamente infalível, não poderiam conhecer os eventos do futuro com exactidão se esses eventos futuros resultassem de opções livres dos seres humanos, dado que estas são em certa medida variáveis. Logo, os seres humanos não têm livre – arbítrio. As suas escolhas dão – se segundo leis naturais.
Formulando de outra maneira o problema: se os pré – cogs sabem com infalível certeza o que escolheremos e faremos no futuro então surge a seguinte questão: temos a liberdade de escolher e de agir de modo diferente do que foi por eles previsto? Se respondermos que sim então parece que os pré – cogs não sabiam realmente o que iríamos escolher e fazer. Se respondemos que não então parece que não agimos livremente quando realizamos as acções que foram previstas. E se não somos livres parece também que não somos moralmente responsáveis pelo que fazemos. Assim, haver conhecimento prévio do que iremos fazer é incompatível com a nossa liberdade e a nossa responsabilidade moral. Aliás, se no filme é possível falar de responsabilidade moral, trata – se de uma responsabilidade moral atípica: uma pré  - responsabilidade, na medida em que o agente seria responsabilizado sem ter praticado o acto mas com base na «certeza» de que praticará esse acto pré – imputável no futuro.

7. Será que pré – conhecimento do que vai acontecer – de acções futuras – significa necessariamente pré – determinação dessas acções? Será que o conhecimento do futuro e o que vai realmente acontecer no futuro são duas coisas causalmente ligadas?
R: Conhecer antecipadamente não parece ser sinónimo de determinar antecipadamente. Imaginemos que duas pessoas estão a ver o mesmo filme em pontos distintos do país. Uma vê o filme em velocidade acelerada e a outra a velocidade regular. Se a pessoa A vir o filme em velocidade acelerada e souber como ele acaba por volta das nove da noite, significa isso que vai determinar mediante esse pré – conhecimento o que a pessoa B – que viu o filme a velocidade regular vai ver por volta das dez horas? É óbvio que não.
Imagine – se também que gravei um jogo de futebol para o meu filho ver e suponha – se que apesar de eu saber o resultado não lhe digo nada. Tenho um pré – conhecimento do futuro – do resultado do jogo – mas dada ignorância do resultado por parte do meu filho não condiciono nem interfiro no modo como ele vai assistir ao jogo e eventualmente vibrar com o acontecimento. Não determino o seu comportamento mediante o meu pré – conhecimento.

8. O programa Pré – Crime baseia – se numa concepção determinista radical da liberdade. Está de acordo? Justifique.
R: O seguinte diálogo é revelador da crença determinista que subjaz ao programa Pré – Crime:
Danny – Sabem da desvantagem legalista da metodologia do pré-crime. [Prender um sujeito antes de ele cometer um assassínio]
Jeff – Outra vez.
Danny – (…) Não nos enganemos: nós devemos prender quem viola a lei.
Jad – Mas eles violarão.
Fletcher – (…) Os pré-cognitivos vêem o futuro e nunca se enganam.
Danny – Não é o futuro se o impedem. Não é um paradoxo fundamental?
John – É. Fala da pré-determinação que está sempre a acontecer. [Atira uma bola pela borda do ecrã transparente. Danny Whitman apanha a bola do outro lado.] Porque a apanhou?
Danny – Porque ia cair.
John – Tem a certeza.
Danny – Sim.
John – Mas não caiu. Apanhou-a. Evitar que algo aconteça não altera o facto de que esse algo ia acontecer.
Acredita – se que os pré – cognitivos têm uma capacidade de antevisão e de previsão infalíveis. A previsão de que algo vai acontecer significa que o acontecimento previsto não pode deixar de acontecer. As previsões dos pré – cogs não admitem futuros alternativos. O futuro não é uma possibilidade em aberto porque a previsão em vez de ser o que possivelmente irá acontecer é o que realmente acontecerá. Estamos perante uma concepção radicalmente determinista da realidade. Está previsto que vou cometer um crime? Sendo essa previsão infalível, como se pretende, faça eu o que fizer não tenho, ao que parece, o poder de mudar os factos. Não tenho controlo sobre os meus actos, não faço o que quero mas o que está determinado. A crença do sistema pré – crime de que as previsões dos pré – cogs são infalíveis, significa que as minhas escolhas e decisões são determinadas, não podem ser diferentes do que são.
As habilidades dos pré – cogs não consistem em predizer intenções ou motivações dos criminosos (0s pré – cogs estão especializados no pré – conhecimento de assassinatos). Não fazem a previsão do que estes pretendem fazer mas sim do que realmente farão. E verem em antecipação o que realmente acontecer significa também que o seu modo de prever não é probabilístico: não prevêem o resultado mais provável de um evento, o que tem mais hipóteses de acontecer, mas o que realmente acontecerá. O programa Pré – Crime exige essa certeza e exactidão porque confinar indivíduos a uma animação suspensa permanente exige certeza e não probabilidade de que serão assassinos.
Ter a certeza de um evento futuro significa que ele tem de acontecer. Mas como é isto possível? Uma vez que o futuro ainda não aconteceu isto só é possível se o futuro for tornado inevitável pelo que está a acontecer no presente e pelo que aconteceu no passado. O presente é fixado e determinado pelo que aconteceu no passado e o futuro é fixado pelo que acontece no presente. Ora é isto o que caracteriza o determinismo radical. Assim sendo, as escolhas e decisões e acções realizadas agora são inevitáveis: não poderíamos ter feito as coisas de maneira diferente. Não há futuro em aberto. Este é fixo porque o presente é fixo e o presente é fixo em virtude do que ocorreu no passado.
9. Diálogo no hotel em que John encontrará Leo Crow em que participam John, o gerente do hotel, e Agatha (a principal Precog)

Gerente: O quarto é 95 por noite.
John: Posso ver os registos?
Gerente: Não pode.
John: [apontando uma arma para o gerente] E agora?
Gerente: Fique à vontade.
John: Ele [Leo Crow] está aqui.
Agatha: Anderton, vá – se embora. Você tem escolha. Vá - se embora. Agora.
John: Não posso. Tenho de descobrir o que aconteceu na minha vida.
Agatha: Por favor.
John: Agatha, não vou matar o indivíduo. Nem o conheço. [...]
John: Não tenho um destino alternativo. Vou matar esse homem.
Agatha: Ainda tem escolha. Os outros nunca viram o próprio futuro. Você ainda tem escolha.
A frase final deste diálogo mostra um argumento interessante. Explicite – o e mostre se é válido. Será bom?
R: o argumento de Agatha é o seguinte:
Se temos conhecimento do futuro, então temos escolha (podemos mudá – lo)
John conhece (viu) o seu próprio futuro (que vai matar Leo Crow)
Logo, John tem escolha (possibilidade de escolher ou de mudar o futuro)
O argumento é válido. Modus ponens.
Será bom? Podemos inverter o argumento:
Se não temos conhecimento do futuro então não temos escolha
Não temos conhecimento do futuro.
Logo, não temos escolha.
Parece profundamente contra – intuitivo que só tenhamos possibilidade de escolha se tivermos um conhecimento do futuro. Contudo, no contexto do filme a liberdade é a possibilidade de mudar o futuro, de manter o futuro em aberto. Ora como mudar algo se não o conhecemos?
10. Diálogo (na estufa de Iris) John e Iris Hineman (a bióloga responsável pelos Precogs)

Iris: Os Pré-Cogs nunca se enganam. Mas, às vezes... eles discordam uns dos outros.
John: O quê?
Iris: Na maioria das vezes, os três vêem um facto da mesma maneira... mas, de vez em quando, um deles vê coisas um pouco diferentes dos outros.

John: Deus do Céu. Como é que eu desconhecia isso?

Iris: Porque destroem-se estes Registos Dissonantes (Minority Reports) assim que aparecem.
John:
Por quê?
Iris: Obviamente, para o Pré-Crime funcionar não pode haver o menor indício de falibilidade. Quem ia querer um sistema judiciário que causa dúvidas? [...]

John: Quer dizer que prendi pessoas inocentes?

Iris: Digo que, de vez em quando, os acusados pelo Pré-Crime... poderiam ter um destino alternativo.

John: Responda-me: Lamar Burgess tem conhecimento dos Registos Dissonantes?

Iris: Sim, claro, ele sabia. Mas, na época, entendemos que eles eram uma variante insignificante.
John: Para si, talvez. E para as pessoas com destinos alternativos que eu prendi? Meu Deus, se o país soubesse...
Iris: O sistema desmoronar – se - ia.
John: Eu acredito no sistema.
Iris: Acredita?
John: Você quer derrotá-lo.
Iris: Você derrotá – lo à se conseguir matar a sua vítima. Seria uma amostra pública espectacular de como o Pré-Crime não funciona.
John: Não matarei ninguém.
Iris: Pense nisso.
a) O que significa dizer que há registos ou relatórios dissonantes?
R: A ocorrência de relatórios minoritários significa que aparentemente o filme não defende uma visão determinista da realidade e do comportamento dos seres humanos. Os pré – cogs têm uma visão probabilista da realidade. Não há sempre acordo unânime entre eles. Isso implica que há múltiplos futuros em aberto, que o futuro não é fixo. Assim sendo, quando um crime é pré – conhecido há a possibilidade de a previsão se revelar falsa.
b) No que respeita a John Anderton confirma – se a previsão dos pré - cogs de que vai matar alguém?
R: Não, embora a suposta vítima morra. Quando localiza o homem que acredita ter sequestrado o seu filho pequeno, Anderton encontra a fotografia do garoto na cama do alojamento do homem, entre uma pilha de outras fotografias de crianças jovens, o que sugere tráfico de crianças ou uma rede de pedofilia. O homem revela que é de facto um criminoso, mas que recebeu a promessa de liberdade e de assistência à sua família se fizer parecer que ou assassinou o garoto ou o pôs em algum terrível cativeiro. Mesmo sob essa grave provocação, Anderton não o mata, mas tenta prendê-lo, e no curso da tentativa de prisão, o sequestrador tem uma queda fatal da janela do quarto. Ocorre a morte que havia sido prevista, mas Anderton não cometeu um homicídio doloso.

c) Iris diz que John derrotará o sistema se matar tal como está previsto a sua vítima. Mas John recusa matar o que lhe fazem pensar ser o assassino do seu filho. Será que assim também derrotará o sistema pré – crime?
R: Se John matar Leo cumpre – se o que estava previsto mas o sistema falha porque a sua lógica de funcionamento consiste prever o que vai acontecer para que não aconteça. Se recusar matar Leo também derrota o sistema porque, em liberdade, mostra que a previsão sobre o seu comportamento falhou. A lógica do sistema falha porque se baseia na ideia de que o que está previsto não pode deixar de acontecer.
11. Considere as seguintes situações:
a)Leo Crow deixa o quarto do hotel porque quer confessar à Unidade Pré – crime a sua participação na armadilha que aquela montou para incriminar John Anderton.
b) Leo Crow deixa o quarto do hotel porque Anderton lhe apontou uma arma à cabeça e lhe disse para sair, caso contrário, as consequências seriam desagradáveis.
c) Leo Crow deixa o quarto do hotel porque está no caminho da Magnum 44 na posse de Anderton mas desgraçadamente cai da janela.
Como avaliaria um determinista moderado as três diferentes acções? Alguma delas seria considerada uma acção livre? Lembre – se que para um determinista moderado uma acção é:
1.Livres quando a sua causa imediata são estados internos do agente e 2 – Não – livres quando a sua causa imediata são estados ou factores externos que o agente não controla.
R: No caso a) a acção é claramente causada por um estado interno: o desejo de Leo de confessar o que fez. A sua acção seria então, de acordo com os deterministas moderados, uma acção livre, sem constrangimentos externos. Mas será mesmo assim? O que faz Leo deixar o quarto de hotel não é exactamente apenas uma causa interna – o seu desejo de confessar – como também o facto externo relevante de que os membros da Unidade Pré – Crime não estão presentes no hotel para que ele possa confessar. A acção de Leo parece derivar de uma combinação complexa de factores externos e internos.
No caso c) os factores que causam a saída de Leo do quarto são claramente externos. Mas deixar o quarto foi uma acção de Leo? Não parece. Acções são coisas que fazemos e deixar o hotel caindo sem querer da janela não foi algo que Leo fez mas sim algo que lhe aconteceu. Não se tratando de uma acção não se põe a questão de saber se é livre ou não.
No caso b) o determinista moderado ou compatibilista diria que a acção não é livre porque a causa da acção é externa: a arma que Anderton aponta à cabeça de Leo. Trata - se na sua perspectiva de uma acção compelida. Mas é esta conclusão incontestável?  Podemos dizer que não. Podemos imaginar uma outra reacção de Leo. Vejamos: Leo tem uma arma apontada à cabeça mas também pode acreditar – causa interna – que a sua vida não tem valor e que ao morrer pode assegurar uma situação financeira estável à sua família – conforme vemos no filme ele acredita que se morrer a sua família terá uma compensação monetária. Ora poderia acontecer que Leo tivesse optado por não obedecer à ordem ameaçadora de Anderton. Nesse caso, a causa imediata da sua acção seria interna – o desejo de não – viver. Regressando ao que aconteceu no filme, podemos dizer que a causa da acção de Leo não é meramente externa pois também conta o seu desejo de viver. A ameaça só tem peso se Leo tiver o desejo de viver. Mas nesse caso, a causa imediata da sua acção seria não a arma apontada à cabeça - causa externa - mas sim o seu desejo de viver que é uma causa interna. Como, de acordo com o determinismo moderado, acções livres são acções cuja causa imediata é interna – desejos e crenças – não teremos que concluir que apesar da arma, a acção de Leo foi livre? A acção de Leo parece derivar de uma combinação complexa de factores externos e internos.
O problema do determinismo moderado é este: em qualquer acção a causa imediata é sempre um estado interno – um desejo, seja o de viver ou de confessar, de almoçar ou de jejuar e assim por diante. O que implica isto? Que o determinista moderado não pode traçar a distinção entre acções livres e não – livres com base na diferença entre causalidade interna e causalidade externa. Usando esta distinção teria de admitir que todas as acções são livres.

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